Para se alterar uma realidade faz-se necessário, antes de tudo, assumi-la e, então, enfrentá-la. Contudo, na percepção dos brasileiros, nossa realidade pode ser equiparada à dos países europeus mais desenvolvidos. Basta haver um pequeno avanço em qualquer segmento, que todas as graves deficiências são esquecidas.
Na pesquisa Retratos da População Brasileira, realizada pelo CNI-IBOPE, por exemplo, na qual 2.002 pessoas foram entrevistadas, a educação foi a 4ª indicada (por apenas 27%) dentre os principais problemas enfrentados pelo país. A fome e a miséria ficaram 7º lugar (8% dos ouvidos) e a habitação em 11º (eleita por 3% do total).
Já no tocante à percepção de bem-estar avaliada pelo PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), de acordo com o Relatório de Desenvolvimento Humano de 2011, a média de satisfação geral do brasileiro com sua vida é de 6,8 (numa análise de 0 a 10), próxima à dos belgas (6,9), alemães (6,7) e noruegueses (7,9).
O Índice de Desenvolvimento Humano brasileiro em 2011 do Brasil foi de 0,718, deixando-o na 84ª colocação mundial, uma acima da do ano passado, mantendo-se entre os países com IDH elevado (entre a 48ª e 94ª colocações). Porém, não há o que comemorar.
O Desenvolvimento Humano de cada país é calculado por meio de um índice que varia de 0 a 1, no qual são consideradas três dimensões: uma vida longa e saudável; o conhecimento e um padrão de vida digno, analisando-se, portanto, a situação da saúde, da educação e da distribuição renda daquele país.
A posição geral do Brasil é baseada em uma média de todos os estados, de forma que os estados bem desenvolvidos compensam as deficiências dos menos desenvolvidos.
Todavia, quando é levada em consideração a desigualdade social (distribuição de renda) de cada país, cria-se um novo índice, denominado IDHD (Índice de Desenvolvimento Humano ajustado à Desigualdade). Nesse indicador o Brasil alcançou apenas a nota 0,519, caindo 13 posições (uma queda global de 27,7%).
Assim, o país ficou abaixo de países como o Uzbequistão (0,544) e a Jordânia (0,565), por exemplo, que são mais pobres, mas menos desiguais.
Conclui-se então, que além de ser o 6º país mais violento do mundo, o 3º que mais mata no trânsito, o país da impunidade, o 84º colocado em índice de desenvolvimento humano, a desigualdade do Brasil supera a de países ainda mais pobres.
Contudo, para a maioria de sua população, a sensação é a de viver em um país desenvolvido, exemplar, igualitário, abastecido; superando, inclusive a percepção de países cujo IDH foi muito elevado, como a Alemanha (0,905).
Contradição que é fruto do conformismo, da complacência, da "memória curta" que tristemente permitem que se fechem os olhos para os delicados problemas do país. Vive-se de sonho, de autoengano, de ideal, para se mascarar a realidade e eximir-se da responsabilidade que a cada um cabe de lutar pela mudança, pela melhora, pela evolução. O país que se almeja depende da forma como é visto. A desigualdade, a miséria, a marginalização está escondida, está debaixo dos tapetes. É impressionante a invisibilidade da desigualdade socioeconômica. Somos desiguais, com baixo índice de escolaridade, mais de 50 mil assassinatos por ano etc. e "felizes"!
Fonte: GOMES, Luiz Flávio; BUNDUKY, Mariana Cury. Desigualdade brutal, 51 mil assassinatos, educação péssima... e o brasileiro é feliz!. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3059, 16 nov. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20429>. Acesso em: 18 nov. 2011.
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